Nestes últimos dias, o Brasil enfrentou uma crise de desabastecimento em razão da greve dos caminhoneiros, que afetou também o setor do transporte aéreo causando transtornos por voo sem combustível. Mas além desta possibilidade, como ficam os direitos dos passageiros em caso de voo cancelado por greve de funcionários ou aeronautas?
Vamos pensar de outra maneira: será que os seus direitos como passageiro deverão ser suprimidos pelo direito de greve? O passageiro será obrigado a voltar para casa após chegar ao aeroporto e receber a notícia do cancelamento de seu voo?
A QuickBrasil decidiu tratar dessa questão em um estudo de caso sobre voo cancelado por greve para ensinar você a exigir o cumprimento de seus direitos antes que possa ser lesado e a reivindicar uma indenização sempre que for desrespeitado pela empresa aérea, até mesmo em casos de greve. Para um consumidor consciente, este texto é indispensável.
1. Voo cancelado por greve dos controladores de voo: e agora?
Em nosso estudo de caso, escolhemos um caso julgado pelo Tribunal de Justiça do Maranhão sobre voo cancelado por greve dos controladores de voo para tratar do tema.
Um viajante chegou ao aeroporto e foi surpreendido pela notícia do cancelamento de seu voo por motivo de greve. Após 24 horas de espera, a empresa aérea finalmente realizou a sua reacomodação em novo voo para que embarcasse rumo ao seu destino. Durante estas 24 horas, a companhia não forneceu alimentação ou acomodação adequadas ao consumidor, que aguardou por todo este tempo no próprio aeroporto.
Em sua defesa, a empresa aérea justificou o cancelamento do voo por greve afirmando que os controladores de voo nacionais apenas realizaram uma “operação padrão”. Por isso, a companhia entendeu não ser responsável por indenizar o passageiro pelos danos causados pelo cancelamento do voo, pois não seria responsável pelo fato que o ocasionou.
2. Um rápido panorama sobre direitos
O exercício da greve é protegido pela Constituição da República, sendo esta paralisação um meio garantido ao cidadão para praticar a defesa de seus interesses. Por isso, é um ato legítimo, não sendo permitido proibi-lo.
Já a defesa do consumidor também é prevista pela nossa Constituição, sendo o Código de Defesa do Consumidor um conjunto de normas com esta finalidade de proteção, que deve sempre ser aplicado às relações de consumo, como aquela que existe entre empresa aérea e passageiro.
Assim, tendo esta noção de igualdade no tratamento de ambos os direitos, podemos dizer que não é possível relativizar um deles em razão do outro: não há como sobrepor o direito de greve ao direito do consumidor ou vice-versa.
Então, qual seria a resposta mais adequada para a situação de voo cancelado por greve do nosso estudo de caso?
3. O direito de greve não anula os seus direitos como passageiro
Eis a resposta: não é porque os funcionários e aeronautas estão exercendo seu direito de greve que a empresa aérea pode desamparar o passageiro. Não são os cidadãos que paralisaram as atividades do setor aéreo aqueles que desrespeitam o consumidor, mas sim a companhia aérea que o desprotege, visto que todas as normas previstas pelo Código de Defesa do Consumidor e pela ANAC continuam plenamente válidas para o fornecedor de serviços, sendo dever da empresa aérea obedecê-las.
Ou seja, apesar do voo cancelado por greve, a conduta da empresa aérea foi abusiva ao desamparar o consumidor e, por causar lesão ao passageiro, deverá ser condenada por meio do pagamento de indenização. Este foi o entendimento do Tribunal de Justiça do Maranhão para a situação de nosso estudo de caso.
Na história relatada, temos situações claras do desrespeito ao direito do passageiro: falta de assistência material e informacional, ausência de opções/soluções para a situação e consequente dano moral em razão da própria situação de cancelamento de voo por greve e do verdadeiro abandono ao passageiro praticado pela empresa aérea.
Vamos explicar cada um deles abaixo para que você possa identificar a situação danosa e exigir o cumprimento de seus diretos assim que perceber o desrespeito da empresa aérea, evitando prejuízos.
a) Assistência material
Ao chegar ao aeroporto em virtude da falta de informação e precisar aguardar por uma solução para o cancelamento do voo, o passageiro deveria receber algumas assistências que objetivam suprir as suas necessidades básicas. Concedidas conforme o tempo de espera, pelas 24 horas aguardadas, o viajante deveria ter recebido cada uma delas, quais sejam:
– Após 1 hora de espera: facilidades de comunicação, como telefonemas e acesso à internet.
– Após 2 horas de espera: alimentação apropriada para o horário (café da manhã, lanche, almoço, jantar etc.), que poderia ocorrer pelo fornecimento da própria refeição ou pelo oferecimento de voucher em valor suficiente;
– Após 4 horas de espera: acomodação adequada, o que significa hospedagem para pernoite e transporte entre hotel e aeroporto.
b) Direito à informação
Certamente, a greve dos controladores de voo não se iniciou sem comunicação prévia ou mesmo de um dia para o outro. Nestas ocasiões, as empresas aéreas já conhecem a situação com certa antecedência.
O direto do passageiro à informação adequada nada mais é que o direito de conhecer claramente tudo sobre a prestação de serviço: forma de execução, horários, datas, valores, regras, condições de segurança etc. Além disso, a ANAC prevê especificamente que as empresas aéreas, sempre que obtiverem informações prévias sobre o voo ou a atividade aérea, deverão comunicar imediatamente ao consumidor sobre o atraso ou cancelamento do voo, sob pena de causar danos a estes.
Por isso, diante do conhecimento e necessidade de cancelar o voo do passageiro de nosso estudo de caso, este deveria ter sido informado adequadamente (em tempo), o que evitaria que chegasse ao aeroporto para então receber a informação do voo cancelado por greve.
Ainda, é importante dizer que sempre que a empresa aérea decidir alterar um voo, esta decisão deverá ser comunicada ao passageiro com antecedência mínima de 72 horas, sob pena de pagamento de indenização pelos prejuízos causados.
c) 3 soluções para atrasos e cancelamentos de voo, alteração de voo e preterição de embarque (embarque negado)
Nestas hipóteses, é dever da empresa aérea oferecer ao passageiro:
– Reembolso integral do valor pago pelas passagens não utilizadas e da tarifa de embarque;
– Reacomodação em outro voo para o mesmo destino na primeira oportunidade (em voo operado por qualquer empresa aérea) ou em momento oportuno escolhido pelo viajante (em voo obrigatoriamente da empresa aérea já contratada);
– Execução do serviço por outra modalidade de transporte, sendo o mais comum percorrer as rotas por via terrestre, seja em carros, ônibus ou trens.
d) Dano moral em casos de voo cancelado por greve
O dano moral ocorre diretamente em razão do cancelamento de voo, que, por si só, gera transtorno, angústia e frustração ao consumidor, principalmente se a companhia aérea desamparar o viajante ou não tomar qualquer providência para sequer confortar o passageiro diante da falha da prestação do serviço.
Neste caso específico de voo cancelado por greve, algumas observações são necessárias. Por mais que a greve seja praticada pelos funcionários ou aeronautas, estando fora do controle da empresa aérea, a responsabilidade objetiva (e a Teoria do Risco do Empreendimento) garantem ao consumidor o recebimento de indenização sempre que sofrer danos causados pelo transporte aéreo.
Isto porque a ocorrência de greve é um risco assumido (e por isso conhecido) pela companhia aérea que decide atuar neste mercado, devendo, assim, assumir os prejuízos causados por este risco. Para entender melhor esta questão, recomendamos a leitura deste post sobre os limites da responsabilidade da empresa aérea.
Caso você tenha conhecimento prévio sobre a greve e queira evitar problemas com cancelamentos e atrasos de voo, lembramos a você pode optar por desistir do voo. Leia neste post informações sobre reembolso, devolução da tarifa de embarque e possibilidade de aplicação de multas por desistência. Se você desejar remarcar o seu voo, recomendamos a leitura deste post.
4. Foi lesado por um voo cancelado por greve? Exija os seus diretos e indenização
Diante do desrespeito da empresa aérea aos seus direitos, você deve buscar um meio adequado para reivindicá-los, para exigir uma indenização e para garantir que a empresa aérea seja punida pela prestação de serviço defeituosa e danosa.
Por tudo o que ensinamos aqui, o passageiro não deve deixar de exigir o cumprimento de seus direitos mesmo em hipóteses de greve. É absurdo que a empresa aérea se aproveite da situação para abandonar o consumidor após a comunicação do atraso ou cancelamento do voo.
Além disso, ainda que a melhoria do serviço de transporte aéreo seja obrigação daqueles que o prestam, somente reivindicando os seus direitos o consumidor será capaz de impedir que este serviço continue a ser prestado sem condições de mínimo respeito ao viajante.
Se você já passou por alguma situação semelhante à relatada, merece ser compensado. Cadastre seu caso aqui
Caso deseje conferir os demais direitos do viajante, acesse a Resolução nº 400/2016, da ANAC.
Apelação Cível nº.: 50552012
Postado em: junho 12, 2018